quarta-feira, 2 de outubro de 2013

LEMBROU-SE O SENHOR (1Sm 1.19,20)




Ser esquecido, não ser notado, não ser percebido, é algo que gera um profundo senso de desvalor, de inutilidade. Não ser lembrado, ser desprezado, machuca os nossos corações. Não é fácil lidar com a indiferença de alguém. É difícil não se magoar nessas horas. Paul Tillich disse que o oposto do amor não é o ódio, mas a indiferença. Porque no ódio ainda resta um sentimento, mesmo que seja negativo, já na indiferença há uma total ausência de sentimento. É como se a pessoa tivesse morta mesmo estando viva. Ser alvo da indiferença, do esquecimento, é algo que destroça o amor próprio. A vida passa a ser vivida sem graça. 

Era assim que Ana se sentia. O seu amor próprio, aquele senso de auto-valor, de utilidade, aquele sentimento de “ser necessário”, estava aos frangalhos. Ela se sentia uma inútil. Olhava para sua própria vida e se via como alguém que nada produziu. Ana se sentia uma mulher que não cumpriu o seu propósito mais básico, ser mãe. Eu imagino que ela olhava para trás e se perguntava: O que eu fiz de importante até agora?! O que eu produzi?! Já estou madura, e o que deixarei de útil nesta vida?! Este olhar a empurrava cada vez mais para baixo. Esta visão era como alguém cutucando uma ferida que teimava em não cicatrizar. 

Não ser mãe naqueles dias era uma desgraça que caia sobre a vida de uma mulher. Não gerar filhos era como uma autorização para que a vida tratasse aquele pessoa da pior forma. O adultério e o concubinato até se “justificavam” quando uma esposa não dava filhos ao seu marido. A sociedade olhava para aquela mulher como uma pecadora. Se ela não gerava filhos é porque havia sobre ela alguma maldição, assim pensavam as pessoas. Ela era vista como uma esposa que não cumpria o seu papel, pois naqueles dias a mulher nascia para ser mãe apenas. 

Ana vivia num ambiente nada favorável a ela. A situação em nada contribuía para levantar o seu moral, em nada contribuía para mostrar o seu potencial em outras áreas. Não havia prazer na vida. Este ambiente transformou Ana numa mulher de coração adoecido. Não bastasse a sua esterilidade biológica, Ana estava ficando emocionalmente estéril. As suas emoções não produziam boas sensações, bons sentimentos, bons pensamentos. 

Ela era alguém amargurada (“Com amargura de alma orou” v.10). A vida tinha para ela um sabor amargo, um tom triste, um toque áspero. Queixas, lamentos, porquês eram coisas presentes na vida na sua vida. Ana era uma pessoa ansiosa e aflita (“Porque pelo excesso da minha ansiedade e da minha aflição é que tenho falado até agora” v. 16). Alguém já disse que “culpa é um peso que carregamos do passado e ansiedade é um peso que carregamos do futuro”. Era exatamente assim que Ana vivia, carregando um peso. 

O seu coração era aflito. Ela era uma mulher atribulada de espírito. Pensamentos recorrentes e medos são coisas presentes na vida de uma pessoa ansiosa. Ana havia desenvolvido uma hipersensibilidade (“Sua rival a provocava excessivamente para a irritar. E todas as vezes que Ana subia a casa do SENHOR a outra a irritava” v. 6,7). Os seus nervos estavam “à flor da pele”. Ela já não tinha defesa emocional, já não havia um filtro psicológico. Tudo que vinha era lido contra ela. O resultado era irritação, choro, falta de apetite e fragilidade. Ana desenvolveu também uma baixa auto-estima (“Se de mim te lembrares, e de tua serva te não esqueceres” v. 11). Quando ela olhava para si mesma a visão que tinha era de alguém esquecida. Na sua perspectiva, Penina era melhor que ela. Ela era a pior esposa. No seu entendimento, até Deus havia se esquecido dela. 

É possível que nos identifiquemos com Ana por uma ou outra situação. É possível que estejamos dizendo para nós mesmo: Eu sei o que é isso! O que Ana viveu é algo que muitos de nós já vivemos ou estamos vivendo. Quem sabe os nossos corações estão feridos e adoecidos como o coração de Ana. A amargura tomou a nossa vida. As pessoas nos vêem rindo, mas por dentro o nosso coração está amargo, triste. A ansiedade tem sido a nossa conselheira. Ela tem nos feito pensar coisas que não deveríamos pensar. Tem nos tirado o sono. Tem nos perturbado o coração. A nossa alma está aflita. 

É possível que só o travesseiro saiba o quanto temos chorado às noites. Estamos hipersensíveis. Qualquer coisa mexe com as nossas emoções. Estamos irritados, temos ferido pessoas a quem amamos. Temos perdido o convívio das pessoas. Quem sabe nos identificamos com Ana por olharmos a nossa vida e não termos nela prazer. Sentimo-nos inúteis. Olhamos para trás e perguntamos: O que produzimos até aqui?! 

Olhamos para dentro de nós mesmos e teimamos em reconhecer o quão doentes estão os nossos corações. Assim como Ana, precisamos ser lembrados pelo SENHOR (v.19). Muitas vezes a solidão é tão grande, a incompreensão é tão gritante, que chegamos a pensar que o próprio Deus se esqueceu de nós. Só Ana sabia o tamanho da sua dor. Nem a sociedade, nem o sacerdote, nem mesmo o seu marido, que a amava, compreendiam o porquê daquele sofrimento (v.8). Nestas horas nada substitui o anseio do coração. Só nós sabemos o valor que tem um desejo, um sonho. A única coisa que supriria o vazio daquele coração era um filho (v. 5). 

Assim, Ana derramou a sua alma perante o SENHOR. E com todos os seus sentimentos orou a Deus e chorou diante do altar. Ana foi clara, não escondeu nada, nem os sentimentos nem o desejo. Ela disse: “SENHOR DOS Exércitos, se benignamente atentares para a aflição de tua serva, e de mim te lembrares, e de tua serva te não esqueceres, e lhe deres um filho varão, ao SENHOR darei por todos os dias da sua vida” (v. 11). E diz a Bíblia: “Lembrou-se dela o SENHOR, ela concebeu e, passado o devido tempo, teve um filho, a que chamou Samuel, pois dizia: Do SENHOR o pedi” v. 19,20. 

Meu querido, Deus está atento a cada sentimento que trazemos no coração. Nada está oculto aos Seus olhos. Por mais que estejamos nos sentido sozinhos, esquecidos por todos, o SENHOR se lembrará de nós. No devido tempo Ele agirá. Agora resta-nos pedir que ele cure as nossas emoções e manifeste o Seu poder nas nossas vidas. Resta-nos entregar de todo coração os nossos anseios ao ETERNO crendo que Ele se lembrará de nós. “Assim, a mulher se foi seu caminho e comeu, e o seu semblante já não era triste”. 

Em Cristo Jesus

Emerson Profírio 

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